Os desafios da liderança na economia digital
23/01/2023 | Artigo
Por Débora Longhi Sabidussi, VP of Performance & Data
Sem exageros, liderar nos últimos três anos foi um desafio diário que exigiu muito dos executivos e suas organizações. Isso porque foi necessário conciliar três agendas inadiáveis: lidar com as restrições e os inúmeros reflexos da pandemia; sustentar a agenda de transformação digital; e ainda manter o negócio lucrativo e vivo. Tudo isso, em um curto espaço de tempo, com poucas referências anteriores e uma grande carga emocional vivenciada por todos.
Não por acaso, uma pesquisa PageGroup/Dom Cabral sobre liderança na pandemia apontou que 40% dos executivos entrevistados foram mais ágeis na tomada de decisões voltadas ao negócio, às operações e à gestão de pessoas. Mostrou também que 77% entendem que houve uma aceleração na adoção de tecnologias. Outra pesquisa, desta vez do Fórum CEO Amcham, identificou que a pandemia impactou a forma de liderar ou fez repensar seu estilo de liderança de 71% dos respondentes.
Neste contexto, chegamos então a mais uma conversa difícil: como liderar na economia digital? Longe de fechar a questão, compartilho aqui um pouco da experiência que tive liderando um time de mais de 200 pessoas.
O que chama a atenção de cara é a liderança à distância. O conhecido trabalho home office se impôs e permanecerá – em maior ou menor grau. Estudos indicam que 85% das empresas adotaram este modelo (Korn Ferry) e que 9 entre 10 brasileiros querem permanecer nele (Sodexo), exigindo, sim, uma postura diferente. Diminui o convívio e impressões pessoais, e entram os processos. Aqui me refiro às reuniões diárias, semanais e mensais, cada uma com seu foco e propósito específicos, as ferramentas digitais de reuniões à distância, organização de tarefas e gestão de equipe.
Mais do que nunca, delegar funções, desmembrar projetos em tarefas e sprints menores, acompanhando não apenas a execução, mas as entregas gradualmente, foi fundamental, ainda mais considerando que a equipe está espalhada em várias cidades e, na grande maioria das vezes, sequer se conhece pessoalmente. De fato, ganha-se complexidade e se reduz um pouco a agilidade, mas é um modelo que se mostrou funcional.
Hoje, com o fim da pandemia, algumas empresas mantém o formato de trabalho híbrido, que nada mais é que a mescla do trabalho remoto com o presencial, em que o profissional consegue vivenciar o dia a dia da empresa com a facilidade do home office.
Em um ambiente instável, a liderança teve que estar mais atenta e aberta às tecnologias e tendências em alta. No entanto, para aplicá-las corretamente, é necessário um conhecimento inicial para se fazer a seleção, iniciar o projeto e montar o time mais adequado. A partir daí, os especialistas assumem.
Aliás, está cada vez mais claro que, na economia digital, extrair o real potencial das inovações requer um time multidisciplinar. Na grande maioria das vezes, o conhecimento de apenas um profissional não é suficiente, tornando, assim, o líder quase como um curador destas capacidades e facilitador das interações entre as pessoas do time.
No meio digital, a presença de profissionais das gerações Y e Z se consolidou ainda mais, demandando adaptações por parte dos gestores (apenas a geração Y já representa mais de 34% da população brasileira). É uma geração mais diversa, muito focada em propósito, causas sociais e ambientais, qualidade de vida e relações mais horizontais, como aponta a pesquisa Deloitte Global Millennial Survey 2020. Ignorar isso traz muitos conflitos e até a perda de talentos.
Cresceu também uma abordagem mais pragmática em relação à inovação (80% das indústrias inovaram na pandemia, com aumento de lucro e produtividade, segundo estudo da CNI, por exemplo). Nem sempre é preciso reinventar a roda. Já existem muitas tecnologias e soluções no mercado, tanto oferecidas por grandes players, como por PMEs e startups. O foco é na aplicabilidade em determinado mercado e, principalmente, em trazer resultados.
Por fim, com tanta mudança e distância física, investir em cultura corporativa deve entrar na lista de prioridades das lideranças. Uma pesquisa da consultoria PWC mostrou que 66% dos executivos acreditam que a cultura organizacional é tão importante quanto as estratégias e o modelo operacional da empresa, e que empresas com uma cultura distinta e presente na agenda da liderança têm uma ampliação na receita (48%) e nos índices de satisfação dos funcionários (80%) e clientes (89%).
Dessa forma, os líderes devem começar seu trabalho nesta área com a avaliação da cultura, identificando os gaps e trabalhando neles, moldando a cultura. Os eventos e cerimônias ganham relevância também. Creio que no Brasil há mesmo esta ânsia pelas conexões pessoais e precisamos preservar isso, explorando esse potencial para fortalecer relações e humanizar a cultura
Temos, ainda, muita incerteza pela frente, mas trabalhar os fatores apontados abre caminho para uma operação coesa e eficiente e até para transformações mais profundas, que podem levar negócios a novos patamares.
Artigo publicado originalmente no site da Época Negócios.